CQRS é uma daquelas siglas que está cada vez mais presente em nossas leituras, muitas vezes encontramos o CQRS sendo citado em conteúdos sobre DDD ou padrões de arquitetura escaláveis.
CQRS é um conceito muito importante e você precisa conhecer. Eu costumo dizer que todo arquiteto possui uma “caixa de ferramentas” e o CQRS é o tipo de ferramenta que precisa estar presente na sua caixa.
O que é CQRS?
CQRS significa Command Query Responsibility Segregation. Como o nome já diz, é sobre separar a responsabilidade de escrita e leitura de seus dados.
CQRS é um pattern, um padrão arquitetural assim como Event Sourcing, Transaction Script e etc. O CQRS não é um estilo arquitetural como desenvolvimento em camadas, modelo client-server, REST e etc.
Onde posso aplicar o CQRS?
Antes de entrar neste ponto vamos entender os cenários clássicos do dia a dia e depois veremos como o CQRS poderia ser aplicado como solução.
Hoje em dia não desenvolvemos mais aplicações para 10 usuários simultâneos, a maioria das novas aplicações nascem com premissas de escalabilidade, performance e disponibilidade. Como uma aplicação pode funcionar bem com 10 ou 10.000 usuários simultaneamente? É uma tarefa complexa criar um modelo conceitual que atenda essas necessidades.
Imagine um sistema de SAC onde diversos atendentes num call-center consultam e modificam as informações de um cadastro de clientes enquanto outra área operacional da empresa também trabalha com os mesmos dados simultaneamente. Os dados do cliente são modificados constantemente e nenhuma das áreas tem tempo e paciência para esperar os possíveis “locks” da aplicação, o cliente quer ser atendido com agilidade.
No mesmo cenário a aplicação pode possuir picos diários ou sazonais de acessos. Como impedir o tal “gargalo” e como manter a disponibilidade da aplicação em qualquer situação?
– Ah! Vamos escalar nossa aplicação em N servidores. Podemos migrar para a nuvem (cloud-computing ex. Azure) e criar um script de elasticidade (Autoscaling) para escalar conforme a demanda.
O conceito de escalabilidade da aplicação vai resolver alguns problemas de disponibilidade como por exemplo suportar muitos usuários simultaneamente sem comprometer a performance da aplicação.
Mas será que só escalar os servidores de aplicação resolve todos os nossos problemas?
Problema # 1
Deadlocks, timeouts e lentidão, seu banco pode estar em chamas.
Escalar a aplicação não é uma garantia de que a aplicação vai estar sempre disponível. Não podemos esquecer que neste suposto cenário todo processo depende também da disponibilidade do banco de dados.
Escalar o banco de dados pode ser muito mais complexo (e caro) do que escalar servidores de aplicação. E geralmente é devido o consumo do banco de dados que as aplicações apresentam problemas de performance.
Problema # 2
Para se obter um dado muitas vezes é necessário passar por um conjunto complexo de regras de negócio que irá filtrar a informação antes dela ser exibida, além disso existem os ORM’s que mapeiam o banco de dados em objetos de domínio realizando consultas com joins em diferentes tabelas para retornar todo conjunto de dados necessários.
Tudo isto custa um tempo precioso até que o usuário receba a informação esperada.
Problema # 3
Um conjunto limitado de dados é consultado e alterado constantemente por uma grande quantidade de usuários simultaneamente conectados. Um dado exibido na tela já pode ter sido alterado por outro. Numa visão realista é possível afirmar que toda informação exibida já pode estar obsoleta.
Ponto de partida
Ter N servidores consumindo um único banco de dados que serve de leitura e gravação pode ocasionar muitos locks nos dados e com isso ocasionar diversos problemas de performance, assim como todo o processo da regra de negócio que vai obter os dados de exibição cobra um tempo a mais no processamento. No final ainda temos que considerar que o dado exibido já pode estar desatualizado.
É este o ponto de partida do CQRS. Já que uma informação exibida não é necessariamente a informação atual então a obtenção deste dado para a exibição não necessita ter sua performance afetada devido a gravação, possíveis locks ou disponibilidade do banco.
O CQRS prega a divisão de responsabilidade de gravação e escrita de forma conceitual e física. Isto significa que além de ter meios separados para gravar e obter um dado os bancos de dados também são diferentes. As consultas são feitas de forma síncrona em uma base desnormalizada separada e as gravações de forma assíncrona em um banco normalizado.
Este é um fluxo simplificado do CQRS que não leva em consideração as camadas de aplicação, domínio e infra, comandos / eventos e enfileiramento de mensagens.
O CQRS não é um padrão arquitetural de alto-nível, podemos entender como uma forma de componentizar parte de sua aplicação. Podemos entender então que a utilização do CQRS não precisa estar presente em todos os processos de sua aplicação. Numa modelagem baseada em DDD um Bounded Context pode implementar o CQRS enquanto os demais não.
Não existe uma única maneira de implementar o CQRS na sua aplicação, pode ser feito de uma forma simples ou muito complexa, depende da necessidade. Independente de como for implementado o CQRS sempre acarreta numa complexidade extra e por isso é necessário avaliar os cenários em que realmente são necessários trabalhar com este padrão.
Entendendo melhor o CQRS
A ideia básica é segregar as responsabilidades da aplicação em:
- Command – Operações que modificam o estado dos dados na aplicação.
- Query – Operações que recuperam informações dos dados na aplicação.
Numa arquitetura de N camadas poderíamos pensar em separar as responsabilidades em CommandStack e QueryStack.
QueryStack
A QueryStack é muito mais simples que a CommandStack, afinal a responsabilidade dela é recuperar dados praticamente prontos para exibição. Podemos entender que a QueryStack é uma camada síncrona que recupera os dados de um banco de leitura desnormalizado.
Este banco desnormalizado pode ser um NoSQL como MongoDB, Redis, RavenDB etc.
O conceito de desnormalizado pode ser aplicado com “one table per view” ou seja uma consulta “flat” que retorna todos os dados necessários para ser exibido em uma view (tela) específica.
O uso de consultas “flats” em um banco desnormalizado evita a necessidade de joins, tornando as consultas muito mais rápidas. É preciso aceitar que haverá a duplicidade de dados para poder atender este modelo.
CommandStack
O CommandStack por sua vez é potencialmente assíncrono. É nesta separação que estão as entidades, regras de negócio, processos e etc. Numa abordagem DDD podemos entender que o Domínio pertence a esta parte da aplicação.
O CommandStack segue uma abordagem behavior-centric onde toda intenção de negócio é inicialmente disparada pela UI como um caso de uso. Utilizamos o conceito de Commands para representar uma intenção de negócio. Os Commands são declarados de forma imperativa (ex. FinalizarCompraCommand) e são disparados assincronamente no formato de eventos, são interpretados pelos CommandHandlers e retornam um evento de sucesso ou falha.
Toda vez que um Command é disparado e altera o estado de uma entidade no banco de gravação um processo tem que ser disparado para os agentes que irão atualizar os dados necessários no banco de leitura.
Sincronização
Existem algumas estratégias para manter as bases de leitura e gravação sincronizadas é necessário escolher a que melhor atende ao seu cenário:
- Atualização automática – Toda alteração de estado de um dado no banco de gravação dispara um processo síncrono para atualização no banco de leitura.
- Atualização eventual – Toda alteração de estado de um dado no banco de gravação dispara um processo assíncrono para atualização no banco de leitura oferecendo uma consistência eventual dos dados.
- Atualização controlada – Um processo periódico e agendado é disparado para sincronizar as bases.
- Atualização sob demanda – Cada consulta verifica a consistência da base de leitura em comparação com a de gravação e força uma atualização caso esteja desatualizada.
A atualização eventual é uma das estratégias mais utilizadas, pois parte do princípio que todo dado exibido já pode estar desatualizado, portanto não é necessário impor um processo síncrono de atualização.
Enfileiramento
Muitas implementações de CQRS podem exigir um “Bus” para processamento de Commands e Events. Nesse caso teremos uma implementação conforme a seguinte ilustração.
Existem diversas opções de Bus para .NET
- Microsoft Azure Service Bus Queue
- NServiceBus
- Rebus (Free)
- MassTransit (Free)
Vantagens de implementar o CQRS
A implementação do CQRS quebra o conceito monolítico clássico de uma implementação de arquitetura em N camadas onde todo o processo de escrita e leitura passa pelas mesma camadas e concorre entre si no processamento de regras de negócio e uso de banco de dados.
Este tipo de abordagem aumenta a disponibilidade e escalabilidade da aplicação e a melhoria na performance surge principalmente pelos aspectos:
- Todos comandos são assíncronos e processados em fila, assim diminui-se o tempo de espera.
- Os processos que envolvem regras de negócio existem apenas no sentido da inclusão ou alteração do estado das informações.
- As consultas na QueryStack são feitas de forma separada e independente e não dependem do processamento da CommandStack.
- É possível escalar separadamente os processos da CommandStack e da QueryStack.
Uma outra vantagem de utilizar o CQRS é que toda representação do seu domínio será mais expressiva e reforçará a utilização da linguagem ubíqua nas intenções de negócio.
Toda a implementação do CQRS pattern pode ser feito manualmente, sendo necessário escrever diversos tipos de classes para cada aspecto, porém é possível encontrar alguns frameworks de CQRS que vão facilitar um pouco a implementação e reduzir o tempo de codificação.
Apesar da minha preferência ser sempre codificar tudo por conta própria eu encontrei alguns frameworks bem interessantes que servem inclusive para estudo e melhoria do entendimento no assunto.
Mitos sobre o CQRS
#1 Mito – CQRS e Event Sourcing devem ser implementados juntos.
O Event Sourcing é um outro pattern assim como o CQRS. É uma abordagem que nos permite guardar todos os estados assumidos por uma uma entidade desde sua criação. O Event Sourcing tem uma forte ligação com o CQRS e é facilmente implementado uma vez que temos também o CQRS, porém é possível implementar Event Sourcing independente do CQRS e vice-versa.
Escreverei sobre Event Sourcing em breve num outro artigo.
#2 Mito – CQRS requer consistência eventual
Negativo. Como abordado anteriormente o CQRS pode trabalhar com uma consistência imediata e síncrona.
#3 Mito – CQRS depende de Fila/Bus/Queues
CQRS é dividir as responsabilidades de Queries e Commands, a necessidade de enfileiramento vai surgir dependendo de sua implementação, principalmente se for utilizar a estratégia de consistência eventual.
#4 Mito – CQRS é fácil
Não é fácil. O CQRS também não é uma ciência de foguetes. A implementação vai exigir uma complexidade extra em sua aplicação além de um claro entendimento do domínio e da linguagem ubíqua.
#5 Mito – CQRS é arquitetura
Não é! Conforme foi abordado o CQRS é um pattern arquitetural e pode ser implementado em uma parte específica da sua aplicação para um determinado conjunto de dados apenas.
Referências externas
- Greg Young (criador do pattern CQRS)
- Martin Fowler
- Los Techies
- Elemar Jr
Caso esteja interessado em conhecer mais sobre o CQRS, Event Sourcing, DDD e boas práticas de desenvolvimento não deixe de conferir a ementa do meu curso:
Vamos continuar a troca de experiências, deixe seu comentário abaixo, se gostou e concorda com o artigo compartilhe com seus colegas para transmitirmos o conhecimento para o máximo de pessoas possíveis.
Valeu Eduardo, mais um post esclarecedor!
Obrigado
Muito obrigado pelo feedback Leandro!
Parabéns pelo post! Estou aprendendo muito com você!
Obrigado!
Muito obrigado!
Excelente trabalho!
Realmente abriu a mente com o conceito de CQRS,
Obrigado!
Muito obrigado Thiago!
Show…
Ficou muito esclarecedor.
Muito obrigado Alison
Ótimo post, bem esclarecedor. Tomei conhecimento sobre o assunto assistindo a palestra do Elemar Jr. no ASP.NET Brasil Conference 2016. Outra referência bacana é o livro “Implementando Domain-Driven Design” do Vaughn Vernon.
Abs a todos.
Muito obrigado Diego!
Sim o Vernon aborda claramente o assunto no livro.
Excelente post! Muito esclarecedor e abrangente.
Muito obrigado Marcos!
Excelente post, rico em esclarecimento. Parabéns Eduardo.
Muito obrigado Rômulo.
Que artigo lindo!
Como sempre de parabéns amiguinho!
Muito obrigado Alan 😀
Eu fiquei com uma dúvida, no problema 3, a questão da informação já obsoleta e imediatamente atualizada pela sincronização garantiria 100% a informação antes da alteração? Eu entendo que o commandstack e o querystack ocorrem em dois momentos distintos, assim a informação que após ter sido modificada e atualizada para o modo querystack pode estar ainda sim desatualizada para um momento commandstack com algum delay, não? Por exemplo, uma aplicação onde um valor é subtraído de um valor montante comum em um determinado departamento de uma empresa… Neste caso não consigo imaginar algo sem um “Lock” real.
Depende da necessidade de depender de dados 100% atualizados em tempo real.
Ao invés de usar o lock você pode usar o esquema de atualização sob demanda por ex.
Um outro caso é ao pedir para editar um registro vc pode enviar uma flag para o banco de leitura sinalizando que aquele dado está passando por uma modificação naquele momento.
Excelente post! Além de detalhar o conceito, aborda várias alternativas pra quem deseja implementar CQRS em seus projetos.
Obrigado!
Muito obrigado pelo feedback Maicon!
Cara, show de bola. Achei interessante essa abordagem proposta pelo CQRS. Parabéns pelo artigo. Att.
Muito obrigado Claudeci
Só a nível de feedback mesmo… Artigo conciso e objetivo.
Muito obrigado!
Excelente texto. Abordou vários aspectos, técnicos e conceituais… me esclareceu algumas dúvidas inclusive. Sempre um prazer ler seus artigos. Parabéns meu querido, acertou na mosca outra vez.
Grande André! Prazer em receber seu feedback muito obrigado 😀
Ótimo artigo.
Obrigado 😀
Parabéns pelo artigo! Deu uma geral bacana.
Só uma observação: apesar do “potencialmente assíncrono”, em outros momentos deu a entender que a command stack DEVE ser assíncrona, o que não é um requisito. Em domínio não tão colaborativos, podemos ir de comandos síncronos mesmo, IMHO. 🙂
[]s
Grande Robson!
Concordo! Levando em consideração cenários mais simples e a não necessidade de consistência eventual o Command Stack pode ser síncrono mesmo.
Abs!
Show de bola Edu, parabéns!
Muito bom o artigo, com conteúdo e didática excepcionais. Estou esperando atentamente um sobre Event Sourcing.
Muito bom artigo! parabéns!!
Muito bom o POST!
Olá Eduardo,
Estou estudando hospedar minha aplicação na AWS… E o serviço RDS, me dá a possibilidade de ter cópias somente leitura dos meus bancos de dados… Então, nesse caso, para ter CQRS na minha aplicação, bastaria eu gravar no banco original e ler nos bancos de leitura? Pois a parte de sincronização é feita pelo serviço AWS RDS… Ou isso não é CQRS?
Eduardo, excelente material é abordagem.
Excelente post meu amigo! parabéns
Excelente Post man.. parabéns !!!
Eduardo, muito bom o seu post sobre CQRS, porém lendo o artigo original do Greg Young fiquei com uma dúvida em relação à obrigatoriedade de divisão física do armazenamento de dados.
No seu artigo você diz que:
“O CQRS prega a divisão de responsabilidade de gravação e escrita de forma conceitual e física. Isto significa que além de ter meios separados para gravar e obter um dado os bancos de dados também são diferentes.”
E no artigo do Greg Young não encontrei uma obrigatoriedade na separação física dos dados de gravação e leitura.
Greg Young cita:
“By applying CQRS the concepts of Reads and Writes have been separated. It really begs the question of whether the two should exist reading the same data model or perhaps they can be treated as if they were two integrated systems, Figure 5 illustrates this concept. There are many well known integration patterns between multiple data sources in order to maintain synchronisity either in a consistent or eventually consistent fashion. The two distinct data sources allow the data models to be optimized to
the task at hand.”
e continua:
“The choice of integration model though is very important as translation and synchronization between models can be become a very expensive undertaking”
O Martin Fowler também não cita obrigatoriedade na separação física entre leitura e escrita no artigo: https://martinfowler.com/bliki/CQRS.html
“There’s room for considerable variation here. The in-memory models may share the same database, in which case the database acts as the communication between the two models. However they may also use separate databases, effectively making the query-side’s database into a real-time ReportingDatabase. In this case there needs to be some communication mechanism between the two models or their databases.”
Ou seja, pelo que pude entender, implementar CQRS em realizando o armazenamento em um único local ou em múltiplos locais no final é uma escolha de implementação, levando em conta custos de implementação e manutenção além de outros. Até porque existem outras técnicas para melhorar o desempenho de leitura que não necessariamente armazenando os dados em locais fixos distintos, como por exemplo realizar cache apenas das leituras já realizadas em um período curto de tempo, criar queries e views otimizadas para o banco específico sem utilizar necessariamente um ORM para mapear os objetos entre outros.
Gostaria de entender mais sobre a obrigatoriedade em se separar o armazenamento ou se é um mal entendimento meu do conceito de CQRS.
Grande Tanato!
Concordo com sua colocação. Tenho a mesma dúvida.
Acredito que tenha casos que essa separação física não traga nenhum ganho.
O fato da “query” ser otimizada pode ter outros fatores influenciando, desde caches até frameworks de acesso otimizado.
Excelente! você é fera de mais.
Li muitos artigos sobre CQRS mas esse certamente foi o mais esclarecedor. Parabéns.
Parabéns!!! Excelente artigo.